quarta-feira, 22 de abril de 2009

Arnaldo Antunes

Eu e minhas colegas Naira e Maricélia estivemos no Salão de Atos da Ufrgs pra assistir ao show do Arnaldo Antunes no dia 2 de abril. Tava massa. Taí uma fotinho (by Maricélia) registro pra posteridade. Abaixo reproduzo um poema do Antunes que publiquei num fanzine lá bem no início da década de noventa.

Eu apresento a página branca

Contra:

Burocratas travestidos de poetas

Sem-graças travestidos de sérios

Anões travestidos de crianças

Complacentes travestidos de justos

Jingles travestidos de rock

Estórias travestidas de cinema

Chatos travestidos de coitados

Passivos travestidos de pacatos

Medo travestido de senso

Censores travestidos de sensores

Palavras travestidas de sentido

Palavras caladas travestidas de silêncio

Obscuros travestidos de complexos

Bois travestidos de touros

Fraquezas travestidas de virtudes

Bagaços travestidos de polpa

Bagos travestidos de cérebros

Celas travestidas de lares

Paisanas travestidos de drogados

Lobos travestidos de cordeiros

Pedantes travestidos de cultos

Egos travestidos de Eros

Lerdos travestidos de Zen

Burrice travestida de citações

Água travestida de chuva

Aquário travestido de TV

Água travestida de vinho

Água solta apagando o afago do fogo

Água mole sem pedra dura

Água parada onde estagnam os impulsos

Água que turva as lentes e enferruja as lâminas

Água morna do bom gosto, do bom senso e das boas intenções

Insípida, amorfa, inodora e incolor

Água que o comerciante esperto coloca na garrafa para diluir o whisky

Água onde não há seca

Água onde não há sede

Água em abundância

Água em excesso

Água em palavras

Eu apresento a página branca

A árvore sem sementes

O vidro sem nada na frente

Contra a água.


Arnaldo Antunes

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