domingo, 9 de dezembro de 2012

Não se dê ao trabalho...


Aqui na praia confirmei o meu talento pra solidão. Passo dias, semanas até, sem falar com ninguém. Um que outro telefonema e era isso. De vez em quando bate uma deprê, mas passa rápido. A verdade é que sou um velho num corpo de jovem (concedam isso, por favor... 41 é jovem), gosto de silêncio e tranquilidade. Vivi durante muitos anos aguentando vizinhos detestáveis que enchiam o mundo de som e fúria (som deles, fúria minha). Me livrar disso foi a melhor coisa que fiz nos últimos tempos. Devo ter algum problema de ouvido ou nervos, algum tipo de hipersensibilidade, porque em quase todos os lugares onde morei (e foram muitos) rolou algum stress por causa de barulho. Agora estou muito bem, obrigado. Minhas eternas alergias desapareceram, meu rosto está limpo, sem coceiras. Meus olhos também. Claro, além do stress com o barulho, me livrei do trabalho explorador, me livrei da poluição da cidade, me livrei dos malditos fumantes (com o perdão dos meus amigos que fumam), me livrei de acordar cedo (na real, não durmo demais... apenas meu relógio biológico é diferente. Leiam esta interessante reportagem sobre esse assunto). Levo a vida tranquila que todo mundo deveria levar. Todo mundo que anseia por um tipo de vida assim, pelo menos.
Outra coisa boa de viver sozinho é que a gente PENSA muito mais. Claro, quanto a isso, mais importante do que viver só é poder viver pra si. Ou seja, não ser um escravo do trabalho. O filósofo Aristóteles já defendia a necessidade do ócio para os que se pretendiam filósofos. Tá, nem todo mundo quer ser filósofo, mas ainda assim seria ótimo que a pessoas usassem um pouco mais da massa cinzenta, fossem capazes de fazer um tanto mais de auto-crítica, conseguissem se distanciar dos preconceitos, senso comum, condicionamentos da tv e jornais, argumentos sofistas, falácias, falta de encadeamento lógico de ideias, etc. Leitura e ócio... e todos os problemas do mundo tavam resolvidos. A propósito, resolvi reproduzir um pequeno texto que li na internet. É curto e diz quase tudo o que penso. Por favor, leiam, É IMPORTANTE!!!:

É preciso abrir mão da perspectiva judaico-cristã que vê a vida ociosa como a mãe de todos os vícios e apenas como uma justa recompensa pelo trabalho realizado. O ócio não precisa de justificação moral. E o trabalho não precisa ser visto como a realização da essência humana em sua plenitude.
Com esta proposta, o filósofo e professor da Unicamp Oswaldo Giacoia Junior encerrou sua apresentação intitulada "Dizer sim ao ócio ou 'viva a preguiça!'", na noite desta quinta-feira no Sesc Vila Mariana, em São Paulo. A conferência faz parte do ciclo "Mutações - Elogio à Preguiça", organizado por Adauto Novaes.
Giacoia iniciou sua palestra trazendo à tona o pensamento transgressor de filósofos como Deleuze, Russell, Bloch, Marcuse. Criticou o que chama de "utopia do lazer" --excesso de consumismo, a indústria do entretenimento, e executivos, dirigentes e profissionais liberais que buscam a otimização do tempo nos momentos de ócio.
"Passamos a vida cumprindo tarefas e demandas sociais. A hiperatividade moderna faz de nós todos seres covardes e indolentes. Em nenhum outro tempo os homens ativos --ou intranqüilos--, valeram tanto. O resultado é a escravidão mental", acrescentou o filósofo, citando Niestzche. "Todos os homens se dividem, em todos os tempos e também hoje, em escravos e livres; pois aquele que não tem dois terços do dia para si é escravo, não importa o que seja: estadista, comerciante, funcionário ou erudito".
Depois, concluiu: "É claro que a vida em sociedade é impossível sem o trabalho. Mas o problema é saber quando o trabalho realiza e quando ao contrário, nega a essência do trabalhador".
Giacoia também fez um convite às maneiras filosóficas de viver o ócio. "É preciso encará-lo como dissipação e não esbanjamento do tempo. Se alguém não é capaz de viver um tempo inteiramente seu, então não tem condição de se abrir para o outro. O nada abre a possibilidade para vivências mais radicais, para as experiências mais singulares sobre o que cada um é capaz de fazer. E nos coloca diante da perspectiva da existência finita e mortal".

Eu li "Elogio ao Ócio", do Bertrand Russell, e também "Manifesto Contra o Trabalho", do Grupo Krisis (série Baderna, da Conrad). Queria muito, mas de todo coração mesmo, que as pessoas lessem essas coisas. O mundo é um festival de equívocos e as pessoas parecem um bando de loucos, insanos, dementes... fazendo coisas prejudiciais porque foram convencidas de que eram boas. O trabalho e a religião certamente os dois maiores destes equívocos.
Em breve devo voltar a vender minha alma em alguma empresa por uns míseros trocados pra pagar aluguel, pensão da minha filha e outras poucas (poucas mesmo, não sou um imbecil consumista) coisas, mas faço isso oprimido, esmagado por essa porra de engrenagem que é muito maior do que eu. Tanto pior fica o negócio quanto mais crítico o sujeito é em relação à coisa. A vontade é de chorar, juro. Além da merda do trabalho aguentar as "opiniõezinhas" do mundo ao redor. Aguentar as músicas (?) de débeis-mentais do mundo ao redor. Aguentar os facebooks e os papos sobre a nova novela das oito ou a pontuação do "timão". Aguentar a manada, a massa acéfala que se compraz em ser estúpida.

Meu rosto vai ficar cheio de perebas.

sábado, 17 de novembro de 2012

Obrigado, Google!

Olha só isso, o Google me felicitando pelo aniversário. Eh... legal! Fico imaginando quantas pessoas abriram o site hoje e tiveram essa surpresa. Se a Sophie Marceau (aquela linda) tem um Gmail (ou faz parte do Google +, não sei), foi surpreendida também. Além dela, Danny DeVito, Martin Scorcese, Mary Elizabeth Mastrantônio (alguém lembra dessa mocinha?) e outros. Isaac Hanson também (putz, porque não um Hendrix, um Jim Morrison, um Ozzy, um Keith Richards, um Little Richard ou um Frank Zappa? Todos sagitarianos... é foda!).
Hoje também é o Dia Internacional do não-fumante (juro que eu já odiava visceralmente o cigarro muito antes de descobrir isso) e o Dia da Criatividade (juro que eu já tentava - eu disse tentava - ser criativo muito antes de descobrir isso).
O Matusalém, consta, viveu 969 anos. Eu fiz 41 e já tô me achando velho. Ou esta história tá meio mal contada ou era muito melhor viver sem tv, internet, computador, supermercado, automóvel, etc, etc.
Buenas... simbora.

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Um ano de (poucas) leituras

Em setembro do ano passado fiz aquela lista dos livros que havia lido até então. Um pouco suspeito aquilo. Seria de se supor que a leitura de tantas obras teria me tornado uma pessoa melhor, imune a impulsos da vaidade, inclusive a de leitor. Buenas, a verdade é que tornou mesmo, juro! Esse negócio de ficar fazendo listas se deve, isso sim, a um transtorno obsessivo-compulsivo. Pelo menos é o que eu diagnostico. TOC. Já fiz listas mais longas e mais condenáveis do que aquela (de uma especialmente, com mais de 1.500 “itens”, tenho vontade imensa de falar, mas ainda não estou pronto).
Não sei se sou um caso exacerbado, mas patológico com certeza. O que me tranquiliza um pouco é a consciência de que todo mundo é meio maluco. Daria um dedo pra ver algumas pessoas “abrindo o coração” como faço neste meu blog “no notion”.
Aqui um aparte: há quem veja nessas “confissões” algo de afetação, de presunção. Acham que o sujeito que faz isso se dá uma importância exagerada. Pois eu penso que é exatamente o contrário. Quando alguém faz este tipo de devassa na própria vida, está se “desimportantizando”. No dia em que não existirem mais coisas veladas, o mundo será bem melhor. Sim, também acho que este dia nunca vai chegar.
Outra razão pra recorrer a esses registros é porque venho, cada vez mais, esquecendo das coisas. Claro, no final das contas não é nada grave esquecer que li este ou aquele livro - a função daquela leitura na minha vida terá se cumprido e lembrar dela, na maioria das vezes, é secundário (aliás, esquecer faz parte. Né, Borges? Né, Ivan Izquierdo?) -, mas se dá pra organizar, porque não fazê-lo?
Então, dito isto, segue uma pequena lista dos livros que li desde aquele longínquo setembro. Pequena mesmo... tenho lido cada vez menos. Só que desta vez vai junto uma mínima resenha para cada obra. Alguns desses títulos são muito bons e tenho a pretensão de despertar o interesse das gentes por um que outro.

Mais Estranho que a Ficção – Chuck Palahniuk
Esse livro merece um texto exclusivo, mas acabei de vendê-lo na Estante Virtual, então tenho de ser rápido e conciso. Como o próprio nome sugere, não é ficção. São crônicas do cara que escreveu “O Clube da Luta”. O Palahniuk é um sujeito muito foda. Tem um recorte de mundo, um interesse literário, que faz dele um caso único entre os escritores (os que eu conheço, pelo menos). Basta ver os temas sobre os quais se debruça neste livro divido em três partes.
A primeira e maior delas são os relatos “Pessoas Juntas”, onde o autor apresenta o panorama de um “American way life” lado B, digamos. Abre com uma história sobre um festival de putaria em Montana, segue com um campeonato amador de luta livre e vai, ao longo de nove relatos, contando coisas sobre: convenções onde escritores novatos tentam publicar seus livros, motoristas malucos que jogam seus carros uns contra os outros em batalhas suicidas, experiências sociológicas com fantasias de animais, proprietários de castelos que ergueram sozinhos - tijolo por tijolo - o seu palácio, experiências com anabolizantes perigosos, a vida de marinheiros confinados por três meses num submarino e casas mal-assombradas e experiências mediúnicas.
A segunda parte se chama “Retratos”, são textos sobre pessoas específicas. Começa com a atriz Juliette Lewis e vai até o escritor Ira Levin passando, ao longo de sete histórias, por Marilyn Manson e outros personagens curiosos.
A terceira parte também tem sete relatos e se intitula “Pessoal”. Embora sejam abordados em alguns dos outros textos, neste bloco o escritor se detém em temas como família (a relação com o pai, principalmente) e a escrita e repercussão estrondosa do seu livro “Clube da Luta”.
Isso é um resumo e portanto diz muito pouco sobre o livro. Cada texto é um mergulho num mundo estranho e fascinante.
Eu diria: não deixe de ler por nada.

Matéria de Memória – Carlos Heitor Cony
O Cony é um grande escritor, todo mundo sabe. Este é apenas o segundo livro dele que leio, mas sei que o cara é foda. Já vi muitas resenhas elogiando suas obras. Este Matéria de Memória (não confundir com Quase Memória, outro livro dele) é, até onde pude ver, um dos menos festejados e, no entanto, trata-se de um ótimo livro. História de desencontros amorosos e afetivos, é construído em cima dos relatos de três personagens principais e um pequeno universo de secundários.
Pungente. Vale a pena ler

Esperando Godot – Samuel Beckett
Achei (e todo mundo acha) bastante parecido com “Fim de Partida”, único livro do Beckett que consegui, antes deste, levar até o fim. No “Godot” a história se baseia numa espera, no “Fim de Partida”, numa ameaça de ir embora, mas de resto são dois livros “irmãos”. É o universo beckettiano aquele. O livro é um clássico da dramaturgia e não carece de resenha. A sensação de angústia, de desconforto, é – pra quem gosta destas experiências (na verdade não se trata de gostar) – garantida. Leia o livro e renove as tintas da sua crise existencial.

Harmada – João Gilberto Noll
Eu nunca tinha lido nada do Noll. Sabia que o cara era conceituado em alguns círculos, já tinha visto/ouvido uma conversa com ele na Feira do Livro de Canoas, mas nunca fui atrás dos seus livros. Recentemente li uma crítica negativa, dizendo que o autor estaria se tornando vulgar, obsceno, gratuito. Buenas, talvez seja. Como só li esse Harmada, não posso opinar. Mas gostei do livro, daquela atmosfera nublada, aquosa, onírica que o autor mantém do início ao fim. E ambígua também. A história quase sempre parece por um fio pra cair num relato homo ou bissexual, mas a sugestão segue até um limite, tensiona a imaginação pra então se render a um desfecho menos transgressor, digamos. Não sei qual é a praia do Sr. Noll, qual rumo seguiu sua escrita depois disso, mas estou curioso pra ler outro livro dele.

Subúrbio – Fernando Bonassi
O Bonassi é foda. Acho estranho que este cara não seja mais comentado. Novamente na Feira do Livro de Canoas, uma vez participei de um bate-papo com ele. Se não me engano, fui eu – então trabalhando na Secretaria de Cultura da Cidade – quem sugeriu o nome do cara para o evento. Ele veio, falou e deixou todo mundo impressionado. Além de muito bom escritor, é roteirista de cinema (Cazuza, Carandiru, Os Matadores) e televisão (Força-Tarefa). Como se pode ver, tem uma afinidade com os temas da violência, da urbanidade e marginais de toda estirpe. E posições muito firmes em relação a todas essas coisas. Um mestre dos micro-contos, escreveu, entre outros, Passaporte, um livro com relatos diversos, muitos contando das suas experiências durante uma bolsa que o levou pra Alemanha.
Mas este livro, Subúrbio. Praticamente dá pra dividir em duas partes: a relação viciada e apática de um casal de velhos num lugar cinzento do ABC paulista e a relação terna e vívida do velho deste casal com uma menininha da vizinhança. É um livro triste, o final é devastador, mas é um retrato possível entre tantos outros terríveis retratos possíveis. É bem escrito e não é gratuito.
Leia e fique abalado por uns tempos.

Putas Assassinas – Roberto Bolaño
Putz... esse não lembro de quase nada. Sei que gostei. Nada muito eufórico, mas gostei. O Bolaño, desde que li 2666, me passa a imagem de um cara meio cioso da sua condição de escritor, poeta. Porque boa parte dos contos – presume-se – são autobiográficos (o nome de um personagem recorrente é “B”) e neles a relação com a literatura é uma constante.  Ele deixa transparecer uma certa afetação e essa transparência sempre confere um “quê” de amador ao escritor (minha opinião). Mas é um cosmopolita e pinta convincentemente – atraentemente até -  seus mundos, ora no México, ora na América do Sul, ora na Europa. Também tem uma mão boa pra relatos mais truculentos.
Talvez seja muito mais do que isso e eu esteja sendo injusto.

Música Anterior – Michel Laub
Diário da Queda – Michel Laub
O Michel Laub é muito bom escritor. Como pessoa (novamente na Feira do Livro de Canoas) me pareceu um antipático, mas isso não significa muita coisa. Ou significa, mas eu é que não vou discorrer por aí. O fato é que isso não impediu que eu lesse quatro dos seus cinco livros publicados, todos muito bons. O problema é que é difícil escrever sobre esses livros. O primeiro é o relato de um juiz sobre a sua relação com o irmão, a doença e a morte do pai, a incapacidade de gerar um filho e a condenação de um estuprador infantil. O que o Laub tira daí encheu um livro de 108 páginas. Poucas, mas denso. Primeiro romance do cara.
Diário da Queda é o mais recente dos livros dele. Conta a história de um cara, de família judaica, vivendo sob o peso da personalidade e da história do pai e do avô e os próprios dilemas em relação a uma história ocorrida na infância, envolvendo um colega de colégio. A narrativa entrelaça a vida de cada um: o avô, sobrevivente do holocausto, transtornado e que acaba se suicidando, o pai zeloso, mantenedor das tradições religiosas e morrendo de Alzheimer e o filho, vivendo com a cobrança de uma reverência ao drama dos antepassados perseguidos e a necessidade de se desvincular deste drama que acaba por afetar a sua vida.
O Michel Laub, cara inteligente (leiam algum dos seus textos no blog da Cia. das Letras), talvez gostasse de me dar umas tapas por essa síntese grotesca que fiz dos seus livros. Ainda bem que nunca vai ler isso.

Um Escritor no Fim do Mundo – Juremir Machado da Silva
Já escrevi sobre este livro num outro texto. Tá em algum lugar deste blog. Mas vai um rápido relato. O estranho Juremir Machado da Silva acompanha o ainda mais estranho Michel Houellebecq a Patagônia. O Juremir não tem medo de soar meio ingênuo – ou clichê – às vezes, e isso me parece uma coisa legal. Fiquei com essa impressão talvez porque muitos trechos do livro são diálogos e acho que foram transcritos tal qual gravados durante as conversas. Bem coloquial. Se você gosta dos livros do Houllebecq, como eu, pode ser legal conhecer um pouco mais do cara.

Trilogia Suja de Havana – Pedro Juan Gutiérrez
Também já falei deste. No mesmo texto do anterior. O que vale ser repetido é: primeiro livro do escritor cubano já há algum tempo famoso no mundo inteiro. O melhor deles, na minha opiniãozinha.
Vale a pena.

Brasil: Terra à Vista! – Eduardo Bueno
Eu tinha um certo preconceito com esses livros do “Peninha”, mas peguei um pra ler para a minha sobrinha e acabei gostando. Bem interessantes mesmo, até para um sujeito como eu, que nunca fui muito ligado em História. É lendária a declaração do autor de que pesquisou em mais de dois mil livros para escrever a série “Terra Brasilis”. E valeu a pena, o cara vendeu muito. Valeu também pela infinidade de informações não propriamente históricas, como por exemplo, a evolução das embarcações e instrumentos de navegação. Pena que não existiam livros assim nos meus tempos da quinta série.
Leitura leve, divertida.

Medo e Delírio em Las Vegas – Hunter Thompson
Outro já comentado. Divertidíssimo pra quem lê, mas provavelmente um tanto assustador pra quem viveu: Mr. Thompson e seu adovogado maluco, dois junkies que se drogavam até a medula. Era pra ser a cobertura de uma corrida de motocicletas, mas os dois se chaparam tanto (o café da manhã era tequila) que o que saiu foi outra coisa, um negócio que seria chamado de jornalismo gonzo. Dizem que este livro é o melhor exemplo disso.
Deleite garantido.

O Mundo Fora dos Eixos – Bernardo Carvalho
Nove Noites – Bernardo Carvalho
O Mundo... já comentei no supracitado texto. É um livro de crônicas, resenhas e ficções. Tem lá cultura e erudição pra deixar a maioria dos reles mortais se sentindo uns toscos (que somos realmente). Gosto principalmente da opinião sobre o que é arte que o Bernardo Carvalho externa em vários destes textos. Monstrão, monstrão.
O Nove Noites é um romance premiado que conta a história de um antropólogo norteamericano que veio ao Brasil estudar os índios que viviam onde hoje é o Tocantins e acabou cometendo suicídio, em 1939. Dividido entre o relato de um escritor que decide escrever sobre o antropólogo e confissões de um personagem desconhecido, amigo do norteamericano quando da sua morte, o livro vai se aprofundando e elucidando o drama do suicida. Livrinho bem difícil de definir, na verdade. Tarefa exaustiva deve ter sido a do Carvalho buscando documentos e depoimentos pra escrever uma ficção sobre esse que é um acontecimento verídico e que se deu há mais de meio século. Não diria que é uma leitura das mais prazerosas, mas é interessante.

Contos Brasileiros – Sérgio Faraco
Também já falei deste. O que não falei é que considero o Sérgio Faraco um baita escritor (neste ele só fez a organização). Um dos melhores aqui da terrinha.

O Zen nas Artes Marciais – Joe Hyams
Outro que já foi falado. Se você se interessa por artes marciais, por filosofias orientais e/ou, na pior das hipóteses, é daqueles que faz uso disso em coisas como administração de empresas, certamente vai gostar deste livro.

Deixando o Pago – João da Cunha Vargas
O último, mas não menos importante. Foi uma grata surpresa quando encontrei este livrinho perdido em meio a uma pilha de porcarias num brique - daqueles que vende de tudo - lá embaixo do Viaduto da Conceição. O livro é raro e consequentemente tem um valor de venda alto (monstro capitalista, eu), mas também foi legal porque nunca antes eu havia “cantarolado” um livro em vez de lê-lo. Pois é, estão ali várias canções dos discos Ramilonga, Longes e Délibáb, do Vitor Ramil. Impossível ler “em linha reta” os belos poemas do “seu” Cunha Vargas uma vez que o Vitor inventou melodias igualmente belas para cada um deles.
Leitura mais que agradável para fãs – ou não - do músico pelotense.

Li mais algumas coisas, quadrinhos principalmente, mas não vou citá-los. Aqui acaba esta lista caudalosa. Doze mil caracteres!!! Vou procurar um médico pra me curar deste TOC.


domingo, 11 de novembro de 2012

Snikt, snikt

Então... um texto sobre o Wolverine. Pois é...
Como eu cheguei nisso? Buenas, eu tava parado aqui, olhando pras dunas e pensando: tu tá bem fodido, Telminho... teu seguro-desemprego acabou. O que tu vai fazer? Pensei, vou mandar um curriculozinho pra alguma editora grande aí. Abril, quem sabe? É... ser ilustrador da Superinteressante ou da Playboy, taí uma coisa que me agradaria. Entrei no site da editora, fui no “trabalhe conosco” e vi que tinha uma ficha enorme pra ser preenchida. Mas tá... comecei. Troço chato. Demorou pra caramba e, quando terminei, a porra do site mostrou um aviso: “seu tempo expirou”. Ou seja, tudo o que fiz foi em vão. Então, assim... de todo o coração: EDITORA, ABRIL: DESEJO QUE CAIA UMA BOMBA EM CADA UM DOS PRÉDIOS DE VOCÊS!!!
- “O que houve com a Abril?”
- “Fechou”.
A Abril fechou... HUAHUAHUAHUAHUAHUAHUAHYUA. Sim, eu sei que sou muito engraçado.

Mas aí, pra não pirar de tanta raiva, fui ler umas coisas na internet. Vocês sabiam que vivemos na época holocena ( há 0,01 milhão de anos) do período neogeno (há 23 milhões de anos) da era cenozóica (há 65 milhões de anos)? E sabiam que antes da cenozóica existiu a era mesozóica (há 251 milhões de anos)? Na era mesozóica existiram os períodos cretácico, jurássico e triássico. Mas não acaba (ou não começa) aí. Antes da era mesozóica existiu a paleozóica (há 540 milhões de anos), com seis períodos distintos. Todas essas eras compreendem o “éon” fanerozóico. Éon é uma medida de tempo geológico que se tentou “arredondar” em 1 bilhão de anos, mas não houve consenso entre os estudiosos. De qualquer maneira é a maior subdivisão de tempo usada pelos geólogos. Um bilhão de anos!!! E antes do éon fanerozóico existiram o proterozóico, o arqueano e o hadeano. São bilhões de anos (bilhões e bilhões, como NÃO diria o Carl Sagan). É uma coisa inimaginável. É o tipo de informação que sempre me deixou muito excitado, os números sobre a idade do planeta e o tamanho do universo. Gosto de ler sobre esses temas pra relativizar minhas preocupações cotidianas e comezinhas. Arranjar um emprego, por exemplo.
Bom, e onde entra o Wolverine nesta história?
De uma maneira bastante besta, na verdade. Vendo informações sobre os períodos da era mesozóica, me deu vontade de desenhar um dinossauro. Aí, desenhando um tiranossauro rex, pensei: putz... que bicho fabuloso! Pra derrotar um desses, só se o cara fosse um... um... tipo assim, Wolverine. E aí mudei o rumo do desenho. Achei que seria engraçada a imagem de um t-rex degolado ao lado do nosso amigo de esqueleto de adamantium. O desenho é aquele ali, logo abaixo.
Mas o Wolverine...
Pois é. Eu vou fazer 41 daqui a 5 dias, ou seja, já não sou lá (nem aqui) muito novinho. O Wolverine foi criado pelo roteirista Len Wein, o diretor de arte John Romita (pai) e o desenhista Herb Trimpe, em 1974. Alguns anos depois disso (talvez 79), fui comprar um chiclete no bolicho perto da casa da minha vó e encontrei, envolvendo a goma, uma figurinha de herói. Eu já lia um que outro gibi da Disney na época, mas heróis me eram desconhecidos. De qualquer maneira, achei interessantes as imagens e comecei uma coleção. Aquela figura amarela de nome esquisito – imaginem uma criança de 8 anos, sem a menor ideia de que existe um idioma chamado inglês, pronunciando “Wolverine”- me instigou a curiosidade de imediato. Quando comecei a escrever este texto pensei: que legal seria ter essas figurinhas pra mostrar. Resolvi dar uma pesquisada no Google, mas sem muitas esperanças. E ACHEI!!! Cara... que coisa incrível! Achei um blog com todas as figurinhas da coleção. Juro, cheguei a me emocionar (devo ser meio nerd, apesar desta cara de fodão). É muito difícil a gente conseguir resgatar coisas assim tão remotas da nossa infância. Se alguém mais mascou aqueles chicletes e também quer rever as figurinhas, clique AQUI (Telminho, sempre gentil, dando o serviço de bandeja).
Então é isso: primeiro contato com o “baixinho invocado”, 1979.
Aí, passaram uns quatro, cinco anos. Eu estava na sétima série. Um colega de aula me emprestou uns gibis da Marvel. Eu peguei porque qualquer coisa com quadrinhos me interessava, mas preferia mesmo os da Disney ou da Mônica (desculpe, Maurício de Sousa, eu reconheço o teu valor, mas aqueles teus gibizinhos são uma descarada leitura de preguiçosos, a gente terminava um em menos de 10 minutos!). Buenas, me apaixonei pelos heróis. Em pouco tempo estava sabendo tudo sobre os universos Marvel e DC. As revistinhas eram já publicadas pela Abril (exploda, Abril!), mas a gente achava muita coisa dos heróis em selos da RGE, da Bloch e da Ebal (acho impressionante que ainda tenha lembrança disso). E foi num gibizinho da RGE que topei com o Wolverine de novo. A primeira história do herói canadense (aquela, de 1974), onde ele já chega enfrentando ninguém menos que o “incredible” Hulk. O desenho - aquele que botei lá em cima - é do Herb Trimpe. Gostei das características do personagem logo de cara. Então (embora hoje isso não mais seja uma coisa importante pra mim), é verdade quando digo que o Wolverine era o meu herói preferido muito, mas muito antes deste oba-ôba em torno do figura.
E lá se foram meus anos de ingenuidade e capacidade de fácil “suspensão da descrença”. Penso que de lá pra cá evoluí um pouco. Quanto aos gibis, não sei. Tecnicamente, sim. Nesse aspecto, os quadrinhos são hoje muito melhor elaborados do que naquele tempo. Os recursos tecnológicos e o aprimoramento dos artistas fazem com que sejam despejados nas bancas toneladas de impressionantes frutos da nona arte. Impressionantes quanto ao desenho e à colorização, mas péssimos no conteúdo escrito. Com isso não estou dizendo que os roteiros de antes eram melhores. Há algum tempo, por pura nostalgia, comprei alguns gibis daqueles dias. Foi decepcionante. Pude perceber então que as histórias eram fraquíssimas (com raríssimas exceções) e que só mesmo sendo um guri de 12, 13 anos pra gostar daquilo. De todo modo, ainda acho que naquele tempo existia uma preocupação maior em manter certa coerência dentro do universo fantasioso. Os heróis não mudavam suas características de acordo com o roteirista. Um personagem não morria numa edição pra ressuscitar três ou quatro depois. 
Mas voltando ao Wolverine. De lá pra cá a história do herói virou uma putaria. O personagem caiu nas graças da rapaziada e a febre de fazer dinheiro dos caras lá “responsáveis por essas coisas” passou com um rolo compressor por cima de qualquer zelo em relação à coerência, consistência, continuidade, verossimilhança, plausibilidade, etc. Com o aumento da popularidade do “Wolvie”, muitas coisas começaram a mudar. Ele se tornou praticamente indestrutível (quem leu "Wolverine, Inimigo do Estado", do débil mental Mark Millar, sabe do que estou falando). Também deve ter se tornado o carro-chefe das vendas. Surgiu como “baixinho invocado”, nas primeiras histórias tinha apenas 1,55m. Hoje as HQs mostram o personagem olhando todo mundo de igual pra igual. Como nesse desenho. O sujeito ficou alto. Depois disso, não tem nem como reclamar quando botam um ator como o Hugh Jackman pra encarnar o herói nas telas. Ouvi muitos dizerem: bah, o cara ficou perfeito no papel. Sim... perfeito... Perfeito pra vocês, que não têm noção de nada, bando de filisteus!!! Esses devem ser os mesmos que gostaram do Michael Keaton no papel de Batman (acho nada a ver até mesmo este magrelo – Christian Bale - que encarna o morcegão atualmente). Mas enfim... mesmo que a escolha do ator fosse mais adequada, nada salvaria aquele filme do Wolverine. Aliás, nada salvaria a maioria destes filmes de heróis. À exceção de Watchmen e Sin City, nenhuma adaptação de quadrinhos para as telas foi bem feita. Pirotecnia simplesmente. Uso e abuso de efeitos especiais e nada de emoção. E assim... vamos combinar, alguns heróis nunca deveriam ser transpostos para a telona. Será que era tão difícil prever que um filme do Capitão América só poderia ser uma merda? E o do Thor? Milhões gastos naquilo (e a Nathalie Portman se prestou – não a amo mais, está fora do meu panteão de deusas) pra sair um filme sem graça alguma (a propósito, alguém gosta do Thor, mesmo nos quadrinhos?).
Mas enfim, escrever sobre isso é pura perda de tempo. Melhor encerrar aqui este texto-tributo à minha infância semi-debilóide – eu diria que na infância é permitido ser meio bobo, desde que se evolua depois. Os gibis de heróis eram e continuarão sendo uma grande bobagem. E os filmes que fazem deles também. Excetuando o Frank Miller e mais um ou dois escritores, roteiristas de quadrinhos de heróis são uns belos duns retardados. Nem mesmo caras festejados como Brian Vaughan ou esse tal Mark Millar escapam deste balaio. Suas histórias se sobressaem às demais, mas continuam sendo bobas, mirabolantes sem conseguir convencer, com falhas ingênuas de roteiro e com soluções fáceis ou esdrúxulas para as tramas que eles mesmos criam (Brian Vaughan escreveu alguns capítulos do Lost e não duvido que tenha uma parcela de culpa naquele final completamente decepcionante da série). Retardados. E quem faz um filme disso está apostando na estupidez de outros retardados, os que leem quadrinhos de heróis ou aqueles que vão ao cinema pra ver qualquer merda que esteja em cartaz. 
Em solidariedade aos que ainda gostam de quadrinhos, um último serviço: pra quem souber ler em inglês, este site tem toda a cronologia da vida do ex-baixinho invocado. Ajuda a entender um pouco das estripulias que os roteiristas debilóides andaram fazendo.
De minha parte, adeus, Wolverine! Foi bom durante um tempo, mas acabou. Me avise quando o Frank Miller resolver fazer alguma coisa contigo.

Abraços!

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Save me, Wonder Woman!

Meu amigo Rodrigo presenteou-me com uma impressora/scanner/copiadora (muito obrigado, Rodrigo!) e agora eu consigo digitalizar decentemente meus - nem sempre decentes - desenhozinhos. Esse aí é o mais recente (decente?). Passei a manhã de hoje colorizando.
De resto, meu seguro-desemprego acabou, minha grana do banco também tá acabando e eu não sei o que vou fazer da vida. Não quero mais trabalhar para os outros e também não quero trabalhar em coisas nas quais não acredito. E eu acredito em tão pouca coisa. É foda... pobre e idealista.
Buenas, minha filha já cresceu (fez 16 segunda-feira, e ganhou de presente um furo no nariz), então acho que vou me largar pelo mundo depois de velho. Claro, se o mundo realmente não acabar logo agora, em dezembro.

quinta-feira, 25 de outubro de 2012

Adeus, Prêmio Eisner!

Achei nos meus arquivos esta página de uma história em quadrinhos que pensei em fazer, lá por 2010. Minhas HQs que nunca saem das três primeiras páginas... tsc, tsc.

Projeto de revista

E o meu irmão quer fazer uma revista voltada para carros e aficionados. Fiz essas propostas de capa e a logo da revista pra ele. A Quatro Rodas que se cuide!

Um desenho

Escrevi dois textos enormes pra botar aqui no blog, mas desisti. Relendo-os, achei idiotas. Então fica um desenho recente. Meio idiota também.

quarta-feira, 10 de outubro de 2012

Mas que droga!

Tem uma professora na Odontologia da UFRGS fazendo um esforço grande pra alertar as pessoas sobre os malefícios do açúcar. Segundo ela, os efeitos danosos do produto se assemelham aos ocasionados pelo álcool. A profe quer que os produtos que contêm açúcar venham com uma informação de alerta e que também sejam pensadas novas formas de tratar as empresas que utilizam a substância (a dos refrigerantes, por exemplo).
E eu pedi demissão mas ainda faço ilustrações ocasionais pro pessoal com quem trabalhava. A chargezinha aí de cima foi feita pra ilustrar essa matéria. Não deixa de ser engraçado que uma coisa aparentemente tão inocente quanto o "doce de uma criança" possa representar um risco. No caso aí da charge a graça está (explicar a piada é foda!) no exagero, caracterizado pelo uso do logo da campanha "Crack nem pensar".

Ou talvez nem seja tão exagerado assim. Leiam a abertura da matéria e julguem por si mesmos:

O jornalista William Dufty causou uma grande polêmica ao publicar, em 1975, o livro Sugar Blues (O gosto amargo do açúcar), onde ele aponta o açúcar branco como uma verdadeira droga – que vicia –, comparando os danos desta substância com os ocasionados pelo álcool, a cocaína e a heroína. De lá para cá, os estudos e alertas aumentaram, mas não foram suficientes para frear o consumo do produto pelos habitantes do globo. Em fevereiro deste ano, três cientistas da Universidade da Califórnia (Robert H. Lustig, Laura A. Schmidt e Claire D. Brindis) publicaram, na revista Nature, o artigo The Toxic Truth About Sugar (A verdade tóxica sobre o açúcar), retomando a advertência feita por Dufty e apontando a ingestão excessiva deste ingrediente como um perigo para a saúde pública.

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Um dia no brejo (ou na estrebaria?)


segunda-feira, 1 de outubro de 2012

Raquel Welch e as minhas camisetas

Tchê, será que já existiu alguma mulher mais linda que esta Raquel Welch? Pooooorfavooooorrrrrr!!! Eu casaria. Eu daria toooodo meu salário pra ela. Eu lavaria as roupas sujas dela (pagaria por isso). Eu deixaria que ela me jogasse na parede, pisasse em mim e cuspisse na minha cara (pagaria por isso também). Linda, linda... TUDO O QUE EU QUERIA NA MINHA VIDA!!!

Buenas, feito esse intróito apaixonado, quero dizer que fiz a minha primeira camiseta em serigrafia. Um desenho em cima de uma cena de um filme com a lindona. A imagem eu tirei de uma revista Set muito antiga que tenho lá nas minhas bagunças. Foi uma dificuldade bem grande descobrir o nome desse filme onde a moçoila aparece vestida apenas com um poncho. Ah, sim... tem mais o cinturão, o coldre e o revólver (atira em mim, Raquel. Me mata!).
Buenas, o filme se chama "Hannie Caulder" e é uma produção de 1971, o ano em que eu nasci (eu tava lá, chorando e mijando e cagando nas calças enquanto a mulher que um dia eu descobriria ser tudo o que eu quero na vida estava no auge da sua beleza, provavelmente enlouquecendo meio mundo). Ignoro o nome que a película recebeu no Brasil, mas ficarei eternamente grato se alguém me disser onde posso conseguir uma cópia com legendas.
A camiseta ficou uma merda. Tô aprendendo serigrafia do jeito mais difícil: com os erros. Putaqueopariu!!! Tudo o que pode dar errado, dá. Esta impressão aí da foto tá fora de registro e muitos dos detalhes do desenho não aparecem, mas ela foi o melhor que consegui. Tenho umas dez camisetas inutilizadas aqui num canto, um registro (fora de registro) do exasperante aprendizado a que me submeti. Sorte que sou daqueles para quem as roupas duram anos, é uma dificuldade me desfazer delas (sim, o tipo que as mulheres detestam... será que a Raquelzinha me detestaria também?), então tinha muitas camisetas velhas para usar neste meu aprimoramento a contragosto. O lado bom é que além de aprender serigrafia com uma relativa economia (em relação ao que poderia ser) vou ficar na obrigação de comprar camisetas novas. Camisetas que levarão algum desenho meu, claro.
A frase embaixo da imagem não é do "Hannie Caulder". É o título de uma música (bem legal) cantada pela Nancy Sinatra. O Tarantino usou na trilha de algum filme... agora não lembro qual.

Para ver a imagem num bom tamanho (não pelo meu desenho, mas pela Raquelzinha, tão linda) clique em cima da foto, depois, com o botão direito do mouse, clique em "exibir imagem" e depois clique de novo para ampliar. Eu casava...

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Os esquisitos herdarão o mundo, Melissa!

E continuando a tradição deste blog, mais um vídeo de um sujeito estranho dançando de um jeito esquisito. O outro, que postei há muito tempo, era do R.E.M. (este). Embora eu não tenha nada (odeio essas negações da negação) contra o Michael Stipe, gosto mais deste, do meu amigo Jack White.
Dancem, esquisitos, dancem!

terça-feira, 25 de setembro de 2012

Blaise Cendrars

Há alguns anos eu morava com meu amigo Jéferson Assumção, e como a biblioteca dele era pelo menos cinco vezes maior que a minha, volta e meia eu tomava algum dos seus livros emprestado. Uma vez passei a mão num volume de entrevistas. Negócio fino, conversas com Borges, Faulkner, Céline, Ezra Pound, T. S. Eliot, Nabokov e outros de igual calibre. Chamava-se “Os Escritores – As Históricas Entrevistas da Paris Review”, Companhia das Letras. Não me recordo se era o primeiro ou o segundo volume – saiu um em 1988 e o outro no ano seguinte -, mas lembro de ter lido quase todas as entrevistas.

Dia desses, por acaso, descobri que os livros foram reeditados. Dei uma bisbilhotada na internet e constatei que estas reedições não repetem alguns dos entrevistados que li. Philip Roth e Henry Miller, por exemplo. Além desses, não consta na capa de nenhum dos calhamaços o nome de Blaise Cendrars, certamente a entrevista que me ficou mais vívida na lembrança. Buenas, desconfiei que em algum recôndito deste vasto universo chamado internet haveria uma reprodução daquela entrevista e fui atrás. Não foi preciso procurar muito, digitei as palavras-chave e já no primeiro link... voilá, eis a relíquia. Apesar de alguns erros de digitação (e/ou ortografia), ela está neste endereço, para quem quiser conferir.
Blaise Cendrars foi um escritor/poeta (entre várias outras coisas) da primeira metade do século passado que influenciou muita gente (seu amigo Apollinaire, por exemplo) e teve uma vida agitada e prolífica. Viveu um tempo no Brasil - que considerava como sua segunda pátria espiritual - e foi amigo dos modernistas. Segundo resenha do site da Companhia das Letras, parte do seu livro Morravagin foi escrito por aqui. Eu tenho duas edições desta obra. Uma, da editora Ulisseia, de Portugal, reproduz o título original, “Moravagine”, mas não tem o complemento que vale o subtítulo da edição brasileira: “O Fim do Mundo Filmado Pelo Anjo Notre-Dame”. Há algum tempo tentei ler, mas a coisa não fluiu, achei chato (mesmo experimentando ora uma, ora outra edição). Talvez venha a reencetar a leitura, mas o que importa aqui não é a obra e sim a vida e o pensamento deste sujeito, Blaise Cendrars. Ou melhor dizendo, a obra importa sim, mas aqui, neste meu pequeno apanhado, só no contexto da significação que ela teve para o próprio autor. É muito maluca, excêntrica ou absolutamente implacável talvez a maneira como esse escritor lidou com a literatura, com a arte e com a sua própria produção.
Para atiçar as curiosidades, separei uns trechos mais interessantes abaixo (o que foi difícil, pois a entrevista é toda muito boa).

- Todos os escritores se queixam das restrições sob as quais trabalham e da dificuldade de escrever.

Para se tornarem interessantes; e exageram. Deviam falar um pouco mais dos seus privilégios e da sorte que têm em poder receber algum retorno financeiro pela prática de sua arte, uma prática que pessoalmente detesto, é verdade, mas que, de qualquer forma, é um nobre privilégio, comparado com a sina da maioria das pessoas, que vive como parte de uma máquina, que vive só para manter os eixos da sociedade girando inutilmente. Sinto pena delas, de todo o coração. Desde que voltei a Paris, venho me entristecendo como nunca diante da multidão anônima que vejo da janela, se aglomerando metrô adentro ou jorrando do metrô, em horários fixos. Falando sério, aquilo não é vida. Não é humano. Tem que ter um fim. E escravidão... não só para os pobres e humildes, mas o absurdo da vida em geral.
Quando uma pessoa simples como eu, que acredita na vida moderna, que admira todas essas fábricas bonitas, todas essas máquinas sofisticadas, pára e pensa aonde tudo isso leva, não pode fazer outra coisa a não ser condenar esse tipo de vida porque, realmente, não é bem o que se chamaria de encorajador.

- E seus hábitos de trabalho? Disse uma vez que se levanta de madrugada e trabalha horas a fio.

Nunca esqueço que o trabalho é uma praga - e, exatamente por isso, jamais fiz dele um hábito... ...Não tenho nenhum método de trabalho. Experimentei um, funcionou, mas isso não é motivo para me ater a ele pelo resto da vida. Tenho mais o que fazer na vida, além de escrever livros.

- Onde começou seu interesse por literatura folclórica?

...Devo a Gérard de Nerval meu amor à música e à poesia populares e, em todos os países do mundo, procurei ouvir, anotar e ler alguma coisa da música, poesia e da literatura do povo, em especial na Rússia, China e Brasil... ...Se a literatura de cordel está um pouco fora de moda em Paris, em um país como Brasil (que é um país novo, tudo parece novo para ele), camadas inteiras da população, que mal aprenderam a ler, estão descobrindo essas histórias de bruxarias, lobisomem. mula-sem-cabeça, fantasmas, humor negro, romance, contos de fada, novelas  de cavalaria, contos infantis, aventuras de bandoleiros e célebres crimes passionais; um repertório de maravilhas que não é mais banal e medíocre em si do que, em países muito mais avançados, as novelas policiais da Inglaterra, as histórias de gângsters dos Estados Unidos e os grandes filmes de amor nos cinemas do mundo inteiro, que também fazem parte das antigas tradições do folclore, da literatura popular.

- Mas no Brasil esse folclore não é inteiramente herdado dos negros?

De forma alguma. O folclore literário é de origem portuguesa. A literatura de cordel foi importada de Portugal...

- Mas os negros que foram levados para lá, eles escreviam?

Os negros levados para lá - quer dizer, os escravos - não escreviam. Eram proibidos de escrever e foi algo completamente excepcional o fato de alguns conseguirem aprender a ler ou escrever. Mais ainda, era proibido imprimir livros no Brasil, vinha tudo de Portugal. A primeira máquina impressora só foi instalada em 1818 no Rio de Janeiro, durante o império. Assim, as Obras completas de Gregório de Matos (1633-96), chamado, com toda a razão, de o François Villon do Brasil e a quem seus contemporâneos chamavam de Boca do inferno, tamanha a violência de suas sátiras à sociedade colonial, não foram publicadas no Rio até 1882, Até então, tinham sido transmitidas por tradição oral e por cópias manuscritas, que circulavam em um determinado grupo da sociedade brasileira: os boêmios da Bahia.

- Ele era negro?

Não, no máximo, bastante moreno, um mestiço, um pardo, como dizem por lá... ...Ele teve a sorte de ser enviado a Coimbra para estudar Direito... ...Quando voltou à Bahia, sua boca maldita e invectivas infernais custaram a ele uma temporada em Angola, no exílio, de onde voltou, mais enfurecido do que nunca, para se fixar em Pernambuco, em regime de prisão domiciliar. Ao invés de se emendar, levou uma vida de embriaguez e devassidão com as garotas negras da beira do cais, Todas as suas canções de amor, algumas realmente muito bonitas, celebram a Vênus negra. Ele morreu na   miséria. Diz a tradição que foi enterrado como o mais miserável entre os miseráveis, com o violão, seu único bem.

- Quando fugiu de casa, com quinze anos, o senhor havia planejado sua fuga? Tinha algum objetivo ou alguma esperança de voltar?

Eu sei lá. Fui para o leste porque o primeiro trem que passou na estação me levou para o leste; se fosse um trem indo para o oeste, eu teria chegado em Lisboa e seguido para a América em vez da Ásia.

- ...por que não continuou a experiência que havia começado com Pâques à New York, Transsibérien e Panama...

Em 1917 eu havia acabado de escrever um poema que me espantava pela plenitude de sua modernidade, por tudo que eu havia colocado nele. Era tão antipoético! Fiquei encantado. E, naquele exato momento, decidi não publicá-lo, para deixar a poesia moderna seguir seu caminho sem mim, para ver o que aconteceria. Guardei o poema não publicado em uma caixa no sótão da casa de campo; e dei a mim mesmo um prazo de 10 anos antes de publicá-lo. Isso foi há mais de trinta unos, e acho que ainda não chegou a hora de publicar esse poema.

- O senhor era mais alegre porque a vida era mais divertida nos bons e velhos tempos?

Meu caro amigo, na Belle Époque, escritores ganhavam um sou por linha nos jornais e um Apollinaire teve que esperar meses, anos, antes que pudesse assinar seus artigos e contar com um emprego estável, com pagamento regular. Por isso ele ele escrevia pornografia... ...Antes de 1914, aqueles que queriam um emprego faziam fila na porta, ou guichê de um balcão de empregos que nunca se abria... ...Para o inferno com o emprego e a vida decente. Nós dávamos risada. As garotas de Paris eram bonitas.

- O senhor anunciou trinta e três livros para o futuro. Por que trinta e três?

A lista de trinta e três livros, que venho anunciando há quarenta anos, não é exclusiva, restritiva ou proibitiva; o número trinta e três é o número-chave da atividade, da vida... ...Não incluí nela os títulos dos romances que nunca escreverei... ...Também encontram-se relacionados os dez volumes de Notre pain quotidien, que já estão escritos, mas que deixei em diversas caixas-fortes em bancos da América do Sul e que, se Deus quiser, serão encontrados por acaso algum dia - os papéis não estão assinados e foram depositados com um nome falso. Também incluí um grupo de poemas que amo mais do que os meus próprios olhos mas que não me decidi a publicar - não por timidez ou orgulho, mas por amor. E tem os livros que estavam escritos, prontos para publicação, mas que eu queimei para a infinita tristeza de meus editores: por exemplo, La vie et Ia mort du soldat inconnu, em cinco volumes. E, por fim, há os bastardos, as larvas e os abortos que provavelmente nunca virei a escrever.

- Conhecia Sinclair Lewis também, não é?

...Ele me mandou um recado dizendo que precisava me encontrar urgentemente. Pedi-lhe que viesse ao estúdio, mas ele me disse que estava resfriado, não gostava de filmes e que, de qualquer forma, não tinha tempo, porque partia para Estocolmo na manhã seguinte, para receber o Prêmio Nobel... ...A porta do banheiro estava entreaberta e a água quente corria pelo corredor. Entrei. A banheira estava transbordando e as torneiras abertas ao máximo. Dois pés, ostentando sapatos finos, novíssimos, pendiam para fora da banheira e, no fundo, um homem de smoking estava se afogando. Foi esse o Sinclair Lewis que conheci. Puxei-o para fora, tirando-o daquela posição infeliz e foi assim que salvei sua vida...
 No dia seguinte eu o coloquei no trem - ele nem sequer me pagou um drinque. É verdade que estava com uma ressaca e tanto, e que provavelmente não queria saber de bebida, ou, talvez, tivesse feito um juramento de nunca mais beber.  Mas promessa de bêbado não vale nada, você sabe.

- Não disse uma vez que se fortalece no amor e na solidão?

Na verdade, os artistas vivem ao lado, à margem da vida e da humanidade; é por isso que são grandes demais ou pequenos demais.

- À margem da humanidade? Então não se considera um artista?  

Não. Já tive trinta e seis profissões e estou pronto para começar outra coisa inteiramente diferente amanhã mesmo.

- E qual a sua opinião sobre Jean-Paul Sartre?

...Existencialismo? Quanto à doutrina filosófica, foi Schopenhauer quem, nos colocou em guarda contra os professores de filosofia que, depois de completar seus estudos formais, meditam, escrevem, pensam, rabiscam mani­festos - e Sartre é um professor... ...Os escritores jovens de hoje - encontrei muitos deles desde minha volta a Paris e me pergunto o que os torna especificamente existencialistas. Será por que eles se disfarçam toda noite para ir a Saint-Germain-des-Pres da mesma maneira que seus pais se vestiam toda noite para freqüentar a sociedade ou ir ao clube? Isso é um modismo que vai passar, que já passou. Não me deixo levar pelo barulho de um desfile. Mas o mundo se entedia consigo mesmo. O cinema, o radio, a televisão...  A verdade é que muito poucas pessoas sabem viver e aquelas que aceitam a vida como ela é são ainda mais raras.

domingo, 16 de setembro de 2012

Meu caro amigo, me perdoe por favor...

E aí, Mimi. Agora tô com internet em casa (depois de muitos problemas) e vai ficar mais fácil a comunicação. De mim não tem muito pra contar. Vim morar na praia pq tava cansado. Cansado de ser explorado no trabalho, cansado de pagar aluguel. Vim pra cá pq não tinha outro lugar pra ir. Morar com os meus pais é impossível (embora meu pai esteja aqui comigo, fazendo obras na casa). Cidreira é uma cidade horrível. É a mais antiga do litoral gaúcho mas o atraso é impressionante. A infraestrutura também. Tudo fecha ao meio-dia. Pra ajudar (embora em muitos aspectos eu ache isso bom), nossa casa fica bem no fim da praia, longe de tudo. Um amigo do meu pai me conseguiu uma bicicleta velha (todas as bicicletas daqui parecem velhas devido aos efeitos da maresia) pra eu conseguir vencer as distâncias. Mas mesmo com uma bicicleta, nem sempre é fácil. As ruas são de pedras completamente irregulares, o que dificulta as pedaladas. Quando chove  (e tem chovido com frequência) muitos trechos ficam intransponíveis. Quase sempre tem um vento que deixa meus olhos irritados (pq junto com o vento vem a areia - areia, aliás, que já tá impregnada até na minha alma, impossível fugir dela) e também dificulta pra caramba as pedaladas.

Nas minhas primeiras semanas tive vários stress com o pessoal da agência de correios daqui. A incompetência é fenomenal. Os livros que vendo na internet são postados na modalidade "Registro Econômico" (ou Registro Módico). Tu não imagina o quanto de incomodação eu tive pra conseguir realizar o simples envio de um livro. Não vou entrar em detalhes porque me irrito só de lembrar, mas pra tu ter uma ideia, na última vez tive que ir a Tramandaí (40 minutos de ônibus) porque o sistema dos belezas tinha caído e eles NÃO TINHAM UMA TABELA FÍSICA para fazer a coisa sem o uso do computador. Enfim, aqui ainda estão na Era Mezozóica, mais ou menos. 
Fora isso, me transferi pra cá bem na época das eleições. Neste momento fico feliz de morar bem no fim da praia, pq aí então os caminhões de som não se dão ao trabalho de ir tão longe. Mas é horrível. Acontece aqui o mesmo que acontece em Canoas (e nas cidades pequenas ou nem tanto do Brasil inteiro, imagino): eles pegam uma música que já é ruim (sertaneja, pagode, funk) e adaptam uma letra enaltecendo o candidato. Então dá-lhe "eu quero um tchum, eu quero um tchá", "ai, se eu te pego", "kuduru" (é assim que se escreve essa merda?) e outros lixos que a massa acéfala ouve passivamente. Eu não sou o maior dos fãs do ECAD, mas esses caras não deveriam fiscalizar este tipo de coisa? Digo, essa apropriação desautorizada (imagino que seja desautorizada) das músicas desses "artistas"? Lá em Canoas (além de um cara que se elegeu vereador usando o nome e imagem do Pateta, da Disney) o atual candidato a prefeito pelo PSDB chegou a câmara, há alguns anos, depois de vários meses estourando os tímpanos das pessoas com um enorme carro de som que repetia à exaustão a adaptação de uma música idiota da igualmente idiota Ivete Sangalo. Esse cara depois se tornou o braço direito da Yeda Crusius, o que me levou ao seguinte raciocínio: Yeda Crusius, do mal. Braço direito da Yeda Crusius, do mal. Consequemente Ivete Sangalo do mal. Mas acho que pode se inverter essa ordem sem qualquer prejuízo... rs. 
Buenas, tô me dispersando. Voltando à vidinha na praia: internet foi outro problema. Esperei por meses uns sujeitos que prometeram uma conexão via rádio. Só me enrolaram. Como estava de saco cheio de pedalar até o centro todos os dias pra conferir meus emails (principalmente os pedidos de livros), decidi apelar pro 3G (completamente inseguro, pois os relatos sobre qual era a melhor operadora - ou a cobertura menos ruim - variavam muito). Numa loja da Vivo em Tramandaí fiquei sabendo da existência de um roteador. O negócio parece que funciona bem (é o que estou usando neste momento pra te escrever este email) e oferece os gigas do modem 3G por um preço mais em conta. O único porém é que não é completamente portátil (até dá pra levar, mas precisa de uma tomada pra funcionar - como ainda sou um neandertal que apenas usa o pc, tá de boa). 
Continuando: vim pra cá com a ideia fixa de tocar uns projetos de serigrafia. Demorou pra eu arriscar uma impressão de verdade, mas o resultado, depois de umas 5 camisetas velhas ficarem definitivamente inutilizáveis, até que foi bom. Estou nisso agora, corrigindo pequenas falhas, acertando dosagens de químicos, tempos de exposição, etc. Preciso comprar uma mesa “carrossel” para impressão serigráfica. Já procurei no Mercado Livre, mas aqui no RS parece não existir tal artefato. Fora a serigrafia, aproveito a total ausência de vizinhos próximos pra brincar pra valer com a minha bateria. Não digo que estou tocando (agora, com internet e uns videozinhos do YouTube, talvez eu acabe aprendendo), mas já é uma satisfação poder fazer barulho a pleno. Barulho, aliás, tenho feito também com a guitarra, o teclado e um trompete que um amigo emprestou (tchê, que instrumento mais complicado!!!). 
E o que mais? Tem uma cadela aqui comigo, a Luma. Ela é tri bonita, acho que é policial, ou capa-preta... não entendo muito de raças de cães, mas sei que ela parece um lobo. O problema é que além dela tem mais 4 cachorros que não saem da volta da casa. Aqui em Cidreira, cada quadra tem a sua matilha de cães abandonados. Dá uma pena, cara. O pior é que tem uns cachorros bem bonitos, uns gigantes que chega a dar medo de passar por perto. Eu tava disposto a cuidar da matilha da minha quadra, mas essas bandas que dou até os mercados pra buscar restos de carne (eu peço “carne pra cachorro”) me cansam e tomam um tempo danado (e custam uns pilas também). Além disso, estou tendo problemas com os pulguentos que não saem do meu portão. Eles ladram pra todo mundo que passa na rua, as pessoas pensam eles são meus. Um dos meus stress com o correio daqui foi porque o carteiro simplesmente se recusa a entrar na minha rua. Fui na agência buscar um livro que não chegava nunca. Na embalagem, a explicação do carteiro: cão solto. Não adiantou eu dizer que a porra do cachorro não era meu, que eu nada tinha a ver com o fato de o bicho andar a solta. Enfim, o problema maior é o abandono. Espero que chegue logo o verão (com seus veranistas) e que eles debandem pro portão de alguma casa que tenha mais a oferecer (eu nem sequer como carne, pô!).
Tenho ido a Canoas/Porto Alegre numa média de duas vezes por mês, mas quero espaçar mais estas viagens. Apesar de aproveitar pra comprar coisas, ir ao dentista e garimpar livros, perco muito tempo na “capital”. Prefiro ficar aqui, enfurnado no silêncio desta casa ao lado das dunas (é um cenário bonito). A Melissa não gostou muito desta minha mudança, mas vamos nos adaptando. Neste fim de semana ela vem pra cá. Eu agora só volto à cidade pras eleições. Com muitas ressalvas, darei meu voto pro Jairo Jorge. Vereador ainda não escolhi. Estou mais curioso com o resultado de Porto Alegre.
Dia destes acabei ficando uma semana inteira por aí (desculpe por não ter feito uma visita). Fiquei porque o pessoal do Diário de Canoas (a primeira turma) organizou um encontro – no fim de semana subsequente ao da minha estada - pra comemorar os 20 anos do jornal. Achei que era melhor ficar do que fazer mais duas viagens (e gastar – agora sou um homem desempregado). Foi bem legal, Mittmann. Estavam lá o Dejair, o Lourenço, o Flávio, o Elias, o Nauro e o Ricardo, um fotógrafo que já tinha saído do DC quando eu entrei. Da turma feminina vieram a Stela, a Naná, a Valéria, a Raquel e a Marília. Enfim, toda a redação original. Além destes estavam a Rita e a Sherelia, que eram da circulação, se não me engano. Foi um encontro massa. O Nauro escreveu um texto bem legal, ilustrado com as fotos do dia, no blog dele. Clica aqui, que tu vai ver. Muita gente mudou (claro, foram quase duas décadas) e eu fiquei meio baqueado, nenhum outro acontecimento nas minhas atividades recentes fez com que caísse tão sonoramente a ficha de que eu sou um quarentão. Mas foi tudo ótimo. Tão ótimo que eu bebi demais e terminei vomitando. O Lourenço foi extremamente gentil e me levou pra casa (o encontro foi no Italianíssimo, mas já estávamos então em Porto Alegre). Eu poderia te contar detalhes sobre a vida atual de cada um deles, mas aí este email, que já tá extenso pra caramba, ia ter o dobro do tamanho, Mimi. Então vou deixar essa conversa para quando nos encontrarmos pessoalmente.
De resto, espero ter satisfeito a tua pergunta sobre como anda minha vida. Claro que muitas coisas não escrevi aqui. A verdade é que estou pensando em colocar este email no meu pra lá de abandonado blog (espero que tu não te importe) e preciso cuidar pra não ficar contando de cada vírgula, de cada suspiro do meu dia-a-dia (o que tornaria enfadonho algo que já não é lá muito excitante).
Um abraço pro Lorenzo (que já deve estar bem grandão) e um beijo pra Weridiana (ela vai votar nos direitosos este ano?).
Abração, Mittmann.

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Na praia...

Caros amigos, estou morando em Cidreira e não tenho internet. Espero ter em breve, mas até lá, este blog continua abandonado.
Tenho trabalhado nos desenhos que quero transformar em estampas de camisetas, ouvido muita música e lido alguns livros. Também trabalho nas coisas da casa. Aqui o silêncio é quase total, uma casa no fim de uma praia vazia.
Luma é a cachorra que divide o espaço comigo. Ela é bonita e tá crescendo muito rápido. Compro restos de carne nos mercados da cidade para alimentá-la. O problema é que tem uma matilha inteira de cachorros vagabundos que fica circulando aqui pelas redondezas. Eu cometi o erro de dar comida uma vez e agora eles não saem do meu portão. Morro de pena desses bichos. Vivem dos restos que os poucos moradores da volta têm pra dar. Desconfio que passam dias sem comer. Dentre todos eles, uma cadela é a mais fiel. Está por aqui desde a primeira vez que vim pra cá. Ela é grande e simpática, tem uns olhos azuis que alguns acham bonitos, e outros, assustadores. Chamam-na Margarete. Como achei este nome ridículo (pra um cachorro), chamo apenas “Marga”.
Eu já tenho a Luma pra dar comida. Na casa dos meus pais, em Canoas, já tem a Nina (cria desta Marga) e o velho e surdo Totó (que já ganhou um texto neste blog). Então, assim... se alguém precisa de uma cachorro grande pra cuidar do pátio (sou contra cachorros em apartamento), pra impor respeito, por favor, venha me fazer uma visita aqui na praia e adote a Marga. Ela é durona, acostumada à vida largada. Com todo este frio que faz aqui no litoral a pobre dorme ao relento (já tentei fazê-la dormir melhor, mas ela parece gostar de se enrodilhar em si mesma e permanecer exposta ao frio).

Buenas, as postagens aqui logo voltarão à frequência de antes. Em breve terei muitas coisas pra mostrar. Ainda estou na fase de adaptação na praia, mas sou assim mesmo, demoro pra começar uma coisa, porque planejo muito. Depois tudo flui...

quinta-feira, 7 de junho de 2012

Livros a 3°C

Feira do Livro de Canoas. Dia 07 de junho. 9 horas da manhã. Temperatura? 3 GRAUS!!!!! Vendas? Péssimas. O que estou fazendo aqui? Pagando pelos pecados (muitos, provavelmente) da última encarnação.
Volto a escrever sobre isso (ou talvez não...).

segunda-feira, 28 de maio de 2012

Um ano depois...

Chargezinha que fiz na época em que foi anunciada a morte do Bin Laden.

quinta-feira, 24 de maio de 2012

Mulheres...

Desenho que fiz pra uma campanha em prol da paridade de gênero nos cargos das empresas e demais entidades onde a predominância é masculina.
Na real acho que é só questão de tempo para as mulheres virem a mandar no mundo.
Em mim elas sempre mandaram. Algumas vezes eu gostei...

quinta-feira, 3 de maio de 2012

Vidinha dura...

Pedi demissão. E como este blog é uma viadagem tipo "meu querido diário", resolvi publicar a carta (dá-lhe egocentrismo!). Como se verá abaixo, sou um baita "sabonete". 

Mentira, sou sempre sincero.

Caras amigas Z. e T., antes de mais nada quero dizer que não foi fácil escrever este email. Demitir alguém não deve ser tarefa agradável, mas pedir demissão também não é. Não quando se tem uma relação de amizade com as chefes (nem mesmo o fato de ser uma reincidência minha tornou a coisa menos delicada). Outra dificuldade é escolher as palavras, tentar deixar claros os motivos e evitar mal-entendidos.
Esse intróito é porque vou fazer um desabafo (talvez nada que vocês já não saibam) e esse desabafo é panfletário (eu pretendia filosófico, na verdade). O importante pra mim é que não seja levado para o lado pessoal.

Sou um descontente, vocês sabem. E não poderia ser diferente, pois entre as minhas - talvez poucas - qualidades está a lucidez. Acho que a minha vida está longe do que considero minimamente bom, minimamente digno. É bem frustrante me ver “quarentão” e praticamente ainda na mesma situação em que comecei, há 25 anos. Na verdade, a frustração é para comigo mesmo, por não ter mais competência pra inverter esse jogo. Mas tem aí também uma dose bem grande de revolta. Porque não sou um medíocre e (ao contrário do que talvez muita gente pense) tampouco sou acomodado. Já tentei dar guinadas na minha vida. Várias vezes. Mas a engrenagem é sempre maior do que a minha capacidade (escrevo isso sem vergonha, pois não sou o único, tá cheio de gente talentosa e competente por aí que não consegue transpor esse nível de dificuldades – as exceções se contam nos dedos de uma mão). Enfim, a revolta é com a injustiça do mundo. É injusto que eu tenha que escolher entre pagar metade do meu salário num aluguel ou morar no fundo de uma vila, com meus pais, e sofrer as agruras do transporte público coletivo. É injusto que eu tenha que usar o meu horário de almoço pra garimpar livros em sebos para depois vendê-los na internet e assim aumentar um pouco (bem pouco) a minha renda. É injusto que eu tire férias para trabalhar numa feira de livros (em pleno inverno) e depois tenha que voltar correndo pro trabalho oficial. É injusto que só agora, aos 40 anos, eu tenha conseguido dinheiro suficiente para um tratamento dentário que deveria ter realizado na adolescência (e isso porque o R. me fez descontos generosos). Enfim, eu poderia ir longe com este rol de coisas que considero injustas.
Vejam bem, estou apenas externando minhas angústias, não estou culpando ninguém.
Quando vocês me chamaram um dia e disseram que tinham pensado em me demitir por que eu “estava custando mais do que dava retorno”, meu pensamento imediato foi: “sacanas... olha só como me tratam!”. Depois pensei: “putz... então não estou dando retorno algum, pois meu salário é tão pouco”. Somente depois é que fui considerar a posição de vocês. Mas isso é sempre difícil para um funcionário. Não faço ideia (e nunca fiz questão de saber) do quanto fatura uma empresa como a V. e de como é feita a divisão do bolo. Não penso nisso, simplesmente faço o meu trabalho. Acho (sempre achei) que um contrato firmado é uma aceitação de termos e um comprometimento. Se o sujeito não está contente, então que pule fora. Se não pode pular fora, então que se resigne e faça o que se propôs a fazer. Penso que sempre agi assim. Sei que tive algumas crises de apatia em certos momentos, mas isso nunca turvou a consciência de que eu era pago pra fazer um trabalho.
Só que na maior parte do tempo era isso: resignação mais do que satisfação (como é para 99,9% da humanidade, provavelmente). Não vejo como poderia haver satisfação em passar a maior parte do meu dia em frente a um computador, fazendo coisas muitas vezes chatas e ganhando por isso apenas o suficiente para necessidades básicas e para estar ali, ativo de novo, no dia seguinte. Nenhuma possibilidade de crescimento financeiro, nenhuma chance de adquirir algo sólido, duradouro, pra modificar e melhorar a vida. É assim na V., foi assim em todas as empresas por onde passei. É a vida de todo mundo que eu me recuso a aceitar.
Não estou dizendo que existe aí uma má-intenção. Reconheço as iniciativas da “V” para ser uma empresa mais humana. Como eu já falei, isto não é pessoal. Tenho um carinho muito grande por vocês e seria um ingrato se não admitisse que tivemos alguns momentos agradabilíssimos juntos. Z. e T., enquanto amigas, são inestimáveis. Enquanto chefes, talvez não possam ser diferentes do que são. Acredito sinceramente nessa impossibilidade e por isso estou escrevendo este email. Mas sou um cara de 40 anos que lê, que pensa... Acho absurda esta vida de escravidão moderna. Continuar resignado com isso está além das MINHAS capacidades. Eu quero, preciso de algo mais.
Já faz muito tempo que entendi que trabalhar para os outros não leva a nada, que o lance é ser o próprio chefe. Só que isso é bem difícil. Já tentei em outros tempos e, por uma série de fatores, não deu certo. Mas sou um revoltado, só o que posso fazer é continuar tentando. Trabalho dois ou três anos em algum lugar, junto um dinheirinho e vou de novo. Nova empreitada, nova tentativa, velho anseio. Vou aprendendo, mas parece que a cada vez se torna mais difícil.

Bom, este email é pra dizer que vou tentar de novo. Vou morar na praia. Além de estar assumindo minha natural inclinação para a reclusão, pretendo minimizar custos. Aluguel, principalmente. E como vou precisar de todo o dinheiro de que puder dispor, quero pedir que vocês, por favor, me demitam. O famoso “acordo”. Não sei se ainda é como antigamente (meu último trabalho de carteira assinada foi na Vz), espero que sim. O Fundo de Garantia e o Seguro Desemprego vão me dar algum fôlego. Além deles, pretendo levantar uns pilas na Feira do Livro de Canoas deste ano. E é por isso que estou fazendo este pedido agora. Posso cumprir meu aviso prévio em maio e, imediatamente após, trabalhar na Feira, que começa em 1º de junho.
Sei o que vocês pensam sobre aviso prévio. Da minha parte só posso garantir que a minha relação com o trabalho continua a mesma, assim como a minha relação com vocês. Sou um funcionário da V., mas antes um amigo da casa. Estou saindo pra tentar melhorar minha vida. Enquanto não saio, continuo fazendo as coisas com seriedade.

Acho que era isso. Desculpe tomar tanto do tempo de vocês. Me estendi assim por achar que devia ser honesto (a maneira abrupta como saí da V. na outra vez – embora não pudesse ter sido diferente – me deixou um pouco chateado à época). Além disso, considero este email uma carta para amigas.

Telmo.

quinta-feira, 26 de abril de 2012

Mens sana in corpore sano

Desenho que pretendo colocar numa camiseta. A partir de junho/julho minha vida vai mudar radicalmente. Desenhos e camisetas fazem parte dessa guinada. E os livros continuarão junto, claro.

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Aborto


Não importa quantos e quão pertinentes sejam os argumentos a favor do aborto, uma coisa é fato: trata-se de tirar uma vida, trata-se de assassinato. Não tem eufemismo nem mudança de paradigma que vá atenuar isso. Num mundo ideal não haveria gravidez indesejada, não haveria estupro, não haveria abandono. Mas como não vivemos no mundo ideal é preciso abordar estas questões e buscar a melhor maneira de solucioná-las. Penso que isso se faz não com senso prático, pragmático (ditado por este estilo de vida capitalista que se leva), mas recorrendo à ética. E por que ética? Porque é o que temos de melhor, é o que nos humaniza. É um regulador moral que pode ser usado universalmente.
Do ponto de vista ético, não tem o que discutir: não se tira uma vida. Esse papo de que “a mulher é dona do seu corpo” vale pra qualquer coisa que ela queira fazer com o próprio ATÉ O MOMENTO EM QUE O CORPO DEIXA DE SER UM SÓ. Até o momento em que existe um outro ser humano ali. A mulher nasceu com a capacidade de parir e, consequentemente, com uma responsabilidade. É uma contingência. É inelutável, incontornável. É um fato que pede apenas resignação.  É claro que essa responsabilidade é também do homem. No caso de um aborto, esse homem é, indiretamente, também assassino desta criança, mas o peso maior desta decisão e deste ato, será sempre da mulher. É ela quem vai sofrer o baque emocional. É ela quem vai ter seu corpo invadido. É ela quem vai correr o risco de trauma ou mesmo de morte. Não é o mundo ideal. É muito peso sobre os ombros, mas o que uma mulher pode fazer senão ser forte? E ser forte (eu pediria perdão às feministas se me preocupasse com o perdão delas) não é decidir por um ferro invadindo o útero.
É chover no molhado dizer que as pessoas deveriam tomar mais cuidado quando trepam. As causas que levam a uma gravidez são as mais variadas e as razões que levam à interrupção de algumas destas gestações são também inúmeras. Muito dessa bagunça depende, basicamente, de educação e qualidade de vida para ser solucionado. Estamos longe disso. Milhares fetos vão continuar parando nas latas de lixo. Cada vez mais, provavelmente. O aborto vem conquistando adeptos ao longo dos anos. Vem ganhando cara de “avanço político”, “avanço de mentalidade”. Sou um cara de esquerda (e ateu), execro preconceitos e conservadorismos perniciosos, mas acho que esta “simpatia” pela causa do aborto é um dos maiores equívocos do nosso tempo. É bárbaro. É desumano.
 “Ah, a criança vai nascer e viver na pobreza”, “sem um pai”, etc. Buenas, não importa. O direito primordial é o de nascer – uma vez que já é uma vida, já é um ser humano. Como vão se resolver as coisas depois neste mundo torto é outra história. Ela pode ser adotada, ela pode acertar na mega-sena, ela pode estudar e vir a ser alguém muito importante... enfim, ela pode. Aquele feto é um ser humano com um futuro em aberto, tudo pode acontecer. Uma mãe é a ligação mais forte, é o sustentáculo dessa nova vida, mas não tem o direito de decidir sobre ela. Pelo contrário, tem a obrigação moral de tentar torná-la a melhor possível (um pai também, e graças aos céus hoje existe exame de DNA e uma lei bastante rigorosa pra garantir a pensão alimentícia de uma criança – isso não contempla todas as situações, mas já é um alento para boa parte delas).
E vou mais longe. Acho que o aborto é um erro (do ponto de vista humano e filosófico) mesmo em casos de estupro e incesto. Não sou insensível a toda carga psicológica aí envolvida. Não tenho dúvidas de que uma mulher atingida pela violência nunca mais será a mesma. Imagino todas as angústias e contradições que vive uma mãe na obrigação de dar afeto ao fruto de um ato indesejado. Sei que é pedir demais para algumas delas. Mas a questão é: um erro justifica outro? Esse feto, essa criança se desenvolvendo na barriga é um outro ser humano, não é o violentador. Essa criança é também um pouco (ou muito) da mãe. Ela pode vir a ser o melhor ser humano do mundo se for bem educada. Mas principalmente é uma coisa viva, com coração, veias, sangue... tudo isso pulsando. Um aborto é o fim desta coisa viva, é um assassinato. Será que uma pessoa tem o direito de matar outra pra garantir sua paz de espírito? Será que não existem outras maneiras de conseguir esta paz? As pessoas se horrorizam quando veem cenas de morte na televisão. É curioso que muitas encarem o aborto com mais complacência. Então não é a mesma coisa? Não se trata de uma vida humana sendo eliminada? Por favor, deixem de hipocrisia!
Acho o aborto justificável apenas em duas circunstâncias: quando existe comprovado o risco de vida para a mãe (ainda assim, com muitas ressalvas, porque “risco” significa que pode ou não acontecer alguma coisa) e em casos de anencefalia. Todo o resto, inclusive casos de crianças que nascem com problemas (síndrome de Down, má formação, etc), devem ser assumidos corajosamente. É ruim, claro. É anular parte da nossa vida pra viver a de um ser com necessidades especiais. Tem vergonha, constrangimento, cansaço, dor, tristeza, enfim, um monte de sentimentos desagradáveis nestas situações. Mas o que mais se pode fazer quando entendemos que somos humanos? Matar não nos torna melhores de maneira alguma.

E claro, também corremos o risco de ter momentos de muita alegria com estes filhos não abortados. 

Post-scriptum: hoje, quase no início de 2015, minha opinião sobre este assunto mudou. Acho importante registrar isso. O aborto sempre será uma coisa atroz, cruel. A discussão mais urgente - e que nos obriga a pensar na descriminalização da prática - é sobre evitar a morte anual de centenas de mulheres (pobres) que recorrem a abortos de alto risco no país. Questão de saúde pública. Num mundo mais justo as políticas de educação e saúde seriam intensificadas. No nosso, temos que evitar, primeiro, que as mulheres morram.
Post-scriptum II: conheci, ao longo da vida adulta, pelo menos uma dezena de mulheres que fizeram aborto (devo ter convivido com outras mais, mas que mantiveram segredo). Todas essas que conheci não se enquadravam na definição "pobre". Todas tinham condições econômicas de sustentar uma criança. Recorreram ao aborto assumindo que um filho, naquele momento das suas vidas, seria uma responsabilidade muito grande, não cabia nos seus planos. Bom... hoje percebo que é um tanto cômodo ficar aqui, na minha condição de homem, pregando que as mulheres não deveriam abortar. Num mundo torto, eu quis pintar as coisas certinhas. Sou contra o aborto, sempre serei. Se tivesse participação no nascimento de uma criança, assumiria a responsabilidade sozinho inclusive. Mas isso vale pra mim, não me atrevo (agora) a entrar no universo dos outros. Espero que as pessoas enxerguem, cada vez mais, as coisas sob uma ótica mais humana e que o mundo se torne menos triste. Por enquanto, só isso.